sábado, 27 de fevereiro de 2016

Et voilá... fim de semana à vossa maneira

... porque quando chove e faz frio as escolhas calorosas são mais ao menos generosas. Algumas, muito a meu jeito....

Cai a Chuva Abandonada

Cai a chuva abandonada 
à minha melancolia, 
a melancolia do nada 
que é tudo o que em nós se cria. 

Memória estranha de outrora 
não a sei e está presente. 
Em mim por si se demora 
e nada em mim a consente 

do que me fala à razão. 
Mas a razão é limite 
do que tem ocasião 

de negar o que me fite 
de onde é a minha mansão 
que é mansão no sem-limite. 
Ao longe e ao alto é que estou 
e só daí é que sou. 

Vergílio Ferreira, in 'Conta-Corrente 1' 



sexta-feira, 26 de fevereiro de 2016

quarta-feira, 24 de fevereiro de 2016

cheguei ao fim do livro...

Merz Schwitters, composição amontoada, 1947
Sozinho,  nunca sei iniciar uma jogada, mas se outro me passar a bola, às vezes consigo marcar golo.
É que Maia ainda é ingénua, enquanto, a mim, a idade tornou-me sábio. E se sabes que és um perdedor, o único consolo é pensar que todos. à tua volta, são uns vencidos, mesmo os vencedores.
....

Maia, restitui-me a paz, a confiança em mim mesmo, ou, pelo menos, a calma desconfiança no mundo que me rodeia. A vida é suportável, basta conformarmo-nos. Amanhã ( como dizia Scarlett O'Hara - outra citação, e sei, mas renunciei a falar na primeira pessoa e deixo só falar os outros) é outro dia.

A ilha de San Giulio voltará a brilhar ao sol.

in, Número Zero, de Umberto Eco, pag, 162, 163

domingo, 21 de fevereiro de 2016

"a Escrita"... bom domingo

A Dúvida, a Solidão, logo... a Escrita

Na vida, chega um momento - e penso que ele é fatal - ao qual não é possível escapar, em que tudo é posto em causa: o casamento, os amigos, sobretudo os amigos do casal. Tudo menos a criança. A criança nunca é posta em dúvida. E essa dúvida cresce à sua volta. Essa dúvida, está só, é a da solidão. Nasce dela, da solidão. Podemos já nomear a palavra. Creio que há muita gente que não poderia suportar o que aqui digo, que fugiria. Talvez seja por essa razão que nem todos os homens são escritores. Sim. Essa é a diferença. Essa é a verdade. Mais nada. A dúvida é escrever. É, portanto, também, o escritor. E com o escritor todo o mundo escreve. É algo que sempre se soube. 
Creio também que sem esta dúvida primeira do gesto em direcção à escrita não existe solidão. Nunca ninguém escreveu a duas vozes. Foi possível cantar a duas vozes, ou fazer música também, e jogar ténis, mas escrever, não. Nunca. 
Marguerite Duras, in "Escrever" 
Desenho de Maria Helena Vieira da Silva, 1949

quinta-feira, 18 de fevereiro de 2016

leituras breves...

Will Barnet (1911 - 2012),
ESCRITO NA PEDRA

“Todos os homens são sensíveis enquanto espectadores. Mas todos os homens se tornam insensíveis quando actuam”
 Alain (1868-1951), ensaísta e filósofo francês. 

Em Jornal Público de hoje
*perdi o rasto do nome do autor do quadro, mas pertence á série de" mulheres com gatos"
* adenda. Mão amiga deixou o nome do autor da pintura. Obrigada, Majo.

quarta-feira, 17 de fevereiro de 2016

mas eu não tenho gato....

Fernand Léger, 1948, "Mulher com um gato"
AS LIÇÕES DOS GATOS
Há um gato para tudo. É um princípio da existência, uma das poucas verdades da vida. Entra-se numa farmácia e lá está um gato na prateleira das latas de leite para bebé. Não se mexe. Não responde às provocações. Nem sequer dá pelo nome próprio, caso os tímpanos dele estranhem a voz de quem o chama.
“Ele porta-se muito bem”, gaba a farmacêutica. “Nunca a deixou ficar mal”, esclarece a Maria João. A farmacêutica interrompe o trabalho para agradecer e confirmar o atestado: “Nunca!”
O gato, majestático tanto na indiferença à conversa como no tédio perante mais aquela reiteração das qualidades dele, levanta ainda mais um grau o nariz, como se isso não fosse geometricamente impossível.
O gato está preparado para o mundo. E é suficientemente aristocrático para esperar o tempo que for preciso para o mundo preparar-se para a preparação dele.
Há no lobby do Algonquin Hotel em Manhattan uma gata chamada Matilda tão mimada que tem nojo às festinhas, embora consinta uma ou duas, por saber o valor que as pobres pessoas como nós atribuem àquele prazer. É uma das poucas cedências que faz às fraquezas humanas. Vale a pena googlar “The Legend Behind The Algonquin Cat” para ficar com uma ideia do pouco que falta para os felinos felizes reconquistarem o respeito do qual em boa hora gozaram junto dos egípcios, que sabiam quem adorar.
Não há na minha vida um único dia que não possa ser salvo pelo conhecimento dum gato, seja através do prazer de conhecê-lo, seja pelos conhecimentos que me transmite.
ARTIGO DE OPINIÃO DE MIGUEL ESTEVES CARDOSO, NO PÚBLICO DE HOJE
   



terça-feira, 16 de fevereiro de 2016

a vida e o frio com arte...

Pieter BruegelThe Hunters in the Snow , 1545

Monthly cycle, scene: The Hunters in the Snow (January)
Música da Flandres, séc. XVI

quinta-feira, 11 de fevereiro de 2016

ditos e datas, 11 de fevereiro...

Arpad Szenes, pinta Helena
Os factos são sonoros. O que importa são os silêncios por trás deles”

 Clarice Lispector 

quarta-feira, 10 de fevereiro de 2016

olhares... e não só

"Un jour de Fête à Sienne", Vieira da Silva, 1950
Andam corações que me pertencem,  à solta pela Toscânia...
Nunca mais é sábado...

segunda-feira, 8 de fevereiro de 2016

. O que um escritor nos dá não são livros. O que ele nos dá, por via da escrita, é um mundo. Mia Couto

«Cartas a Sandra» representa um hino ao amor numa toada filosófica que abre ao leitor perspectivas muito interessantes sobre o tema e a muitos outros que com este se relacionam - amizade, ciume, sexo, e tudo o mais que concerne às coisa do Amor.
Li este livro, em 1996, Maio. Li de uma assentada, antecedido de" Para Sempre. "A 5 de Maio desse ano morre o meu pai. A 8 a 9 ofereci o livro a minha mãe, pelo amor tão belo que sempre os vi viver. Ele tinha 71 anos, a minha mãe fará 88 na próxima quinta feira. A solidão não é palavra que se lhe encaixe, sempre bem acompanhada ou com ela própria. E, eu não parti como a Xana. 

Excerto

Julgo, aliás, que o amor, não bem o erotismo, foi por fim uma espécie de Valor que lhe redimia a vida inteira, ou, como ele dizia, qualquer coisa em que pudesse repousar a cabeça. Num tempo em que nada valia nada, surgia-lhe assim, sobretudo no fim da vida, uma forma de a justificar, como outros a redimem com a agitação política ou mesmo desportiva, que eram, segundo ele, um modo menor de a si mesmos se iludirem. 

(...) O amor é tão monótono, querida. Porque ele é o cimo sensível de uma imensidade de coisas que se esqueceram. Como falar desse mínimo que é o vértice de todo um mundo que o sustenta? Falar de nada, que é o todo nele? Sandra. Podia dizer o teu nome infinitamente na multiplicação do que nele me ressoa. E é assim o que mais me apetece, dizê-lo dizê-lo. E ouvir nele o maravilhoso que me abala todo o ser. Poderia escrever o teu nome ao longo do que escrevo e teria talvez dito tudo. Mas eu quero desse tudo dizer também o que aí se oculta. Dizer o meu enlevo e a razão de ele me existir. As tuas mãos nas minhas. O incrível miraculoso de eu dizer o teu rosto. O ardor de um meu dedo na tua pele. Na tua boca. O terrível dos meus dedos nos teus cabelos. O prazer horrível até à morte da minha entrada no teu corpo.

domingo, 7 de fevereiro de 2016

leituras breves e profundas...

"Porquê? Para quê? Economiza os teus "porquês" e "para quê". Ou utiliza-os só até onde houver resposta."

Virgílio Ferreira

sábado, 6 de fevereiro de 2016

bom fim de semana


ESCRITO NA PEDRA
“Pelos mesmos caminhos não se chega sempre aos mesmos fins” Jean Jacques Rousseau 
(Jornal Público de hoje)

Fotografia de Nicolas Muller, 1939, Porto
Uma mega exposição de fotografias suas estão expostas no Centro Cultural de Cascais. A não perder.


quarta-feira, 3 de fevereiro de 2016

porque há dias assim... (poema completo)

NOS DIAS TRISTES NÃO SE FALA DE AVES

Nos dias tristes não se fala de aves.
Liga-se aos amigos e eles não estão
e depois pede-se lume na rua
como quem pede um coração
novinho em folha.

Nos dias tristes é Inverno
e anda-se ao frio de cigarro na mão
a queimar o vento e diz-se
- bom dia!
às pessoas que passam
depois de já terem passado
e de não termos reparado nisso.

Nos dias tristes fala-se sozinho
e há sempre uma ave que pousa
no cimo das coisas
em vez de nos pousar no coração
e não fala connosco.
Filipa Leal

( as minhas fotos, os meus olhares...)

terça-feira, 2 de fevereiro de 2016

segunda-feira, 1 de fevereiro de 2016

"Gravíssimo attentado contra a família real" - 1 de fevereiro de 1908 . E, viva a República.



A problemática do tiranicídio (e do regicídio) moderno surgiu crescentemente ligada a uma filosofia da história secularizada, cujo sentido optimista teria remover os obstáculos ao seu percurso progressista, sobretudo porque se acreditava que, por essência, ou por razões sociais injustas mas ultrapassáveis, todo o poder era despótico.
Daí que o seu executor aparecesse como um justiceiro animado pelo que ele (ou o grupo em que se integrava) achava ser o imperativo inscrito no devir histórico, logo, como um revolucionário cheio de pressa para que o futuro 
chegasse mais cedo. Heroicidade que lidava mal com os reformismos  

ou com os movimentos que colocavam o motor da transformação social num sujeito anónimo e colectivo, condenando a violência individualizada. Filho do modo romântico de encarar a revolução, o tiranicida dos finais do século XIX e princípios de Novecentos irrompeu como um herói individual, embora justificasse a sua acção por valores universais e redentores, fosse a pátria, o oprimido, ou toda a humanidade escravizada pela exploração e pelo sofrimento. Com isso, porém, o seu acto fazia-se acompanhar pela simultânea individualização da responsabilidade pelo opressivo transcurso da história.
Compreende-se, assim, que, mesmo quando ideologicamente o não era, os seus protagonistas se movimentassem numa mitologia de fundo anarquista e mesmo, em casos mais radicais, niilista. Horizonte que ganhou particular relevo a partir das últimas décadas de Oitocentos, e que impulsionará uma espécie de onda que submergiu reis, imperadores, ministros e presidentes de repúblicas, desde a Rússia, os EUA, a França, a Itália, a Espanha, até, entre outros locais, Portugal e o Império Austro-Húngaro. E se, na Antiguidade, o tiranicídio era desculpabilizado em nome da restauração da ordem natural da pólis, e se, na justificação teológica, se matava em nome de Deus e da pátria celeste, com a Revolução Francesa e com as suas apropriações anarquistas e patriótico-nacionalistas posteriores, o considerado como déspota era executado por quem pensava estar a cumprir uma missão resgatadora, agindo, assim, como juiz único da razão e do tribunal da história.



Retirado de Fernando Catroga, Ensaio Respublicano 

Retirado da página de FB , de A textos e pretextos de Fernando Catroga